Por Cláudio Fernandes
O Rio de Janeiro é uma cidade conhecida por suas belezas naturais. A cada verão e mesmo fora da estação mais quentes, milhares de turistas chegam, do Brasil e de fora, para desfrutar da orla mais famosa do mundo, do carnaval, do Maracanã, do Cristo Redentor e de outras tantas atrações.
Acontece que, no coração desta metrópole, encontra-se um símbolo de cuidado e compaixão que perdura por séculos: a Santa Casa de Misericórdia do Rio de Janeiro. Fundada em 1582, esta instituição é uma referência incontestável no cuidado à saúde e assistência social para a população carioca.
Ao longo dos anos, a Santa Casa se estabeleceu como um centro de excelência em diversas áreas da medicina, oferecendo uma ampla gama de serviços que vão desde a pediatria até a geriatria. A instituição também é um importante centro de formação de profissionais de saúde, contribuindo para a capacitação de médicos, enfermeiros e técnicos em diversas especialidades.
Para falar mais sobre a história, o momento atual e o futuro desse presente do Rio de Janeiro para si mesmo, a Tribuna da Imprensa teve a honra de conversar de maneira exclusiva com Francisco Horta. Personagem histórico da cidade e – porque não – do país, o Dr. Horta é juiz aposentado, professor, presidente eterno do Fluminense e atual provedor da Santa Casa. Sua relação com a instituição, entretanto, existe há 60 anos.
Por conta de sua dedicação, há duas semanas foi homenageado, recebendo a Medalha do mérito do judiciário como Provedor da Santa Casa de misericórdia.
Acompanhe os principais momentos da conversa
Isso não é uma entrevista
A primeira coisa que se nota ao entrar no belíssimo apartamento do Doutor Francisco Horta, em Laranjeiras – onde mais poderia ser – está fora dele. Ao adentrar a sala, é impossível não ver o Cristo Redentor defronte à porta de vidro, do alto do corcovado. A pergunta, então, se impõe: É desta sala que, nos jogos do Fluminense, o senhor pede ‘a benção, João de Deus’. Doutor Horta sorri, entende a referência (cântico clássico da torcida do Fluminense) e, orgulhoso da vista, aponta para o outro lado. “E ali fica o Pão de Açúcar”.
Em seguida, como orador nato, informa. ‘Não quero dar entrevista. Normalmente são muito chatas. Já falei demais, é hora de agir’. E, de fato, não houve entrevista. Doutor Horta se acomodou no sofá e deu uma aula de vida.
Doutor Horta e a Santa Casa
Meu pai era médico da Santa Casa. Eu, advogado. Em determinado momento, ele pediu que eu fosse admitido na instituição. Então o provedor da época disse que me daria um cargo administrativo. “O menino vai entrar como funcionário. Se for bom, fica”. Isso foi em 1963. Estou com 89 anos. Deus me protegeu e, sobretudo, fiz muitos amigos.
História de amor
Eu não saberia descrever o tamanho da minha honra por estar no cargo que ocupo. Trata-se de uma instituição que tem mais de 450 anos no mesmo prédio. Há uma pintura lá em que você vê o mar chegando ali. É como era à época. Isso é uma coisa extraordinária.
O dono da Santa Casa
A Santa Casa pertence ao Nosso Senhor Jesus Cristo. Repito, é uma honra servir naquele lugar. É um privilégio. Eu não tenho salário. Os mordomos também não recebem salário. Você se distingue na sua profissão e é convidado para ser irmão da Santa Casa. Então ela tem hoje 278 irmãos.
O momento atual
Temos grandes profissionais trabalhando lá. Doze dos 100 médicos mais notáveis da Academia Brasileira de Medicina trabalham na Santa Casa. Há também uma maravilhosa área odontológica. Seis cadeiras equipadas com o que há de mais moderno no momento. A Santa Casa vem amadurecendo projetos dentro da sua essência, como a reestruturação dos hospitais e um novo e moderno hospital no imóvel da Glória, onde por muitos anos funcionou a faculdade de medicina Souza Marques. Assim, todo nosso esforço consiste em atender da melhor forma quem precisa, inclusive e principalmente aqueles que não podem pagar.
A crise financeira
Administramos 17 cemitérios durante 94 anos. Isso ultimamente nos gerava uma renda de R$ 3 a 4 milhões por mês. Conseguíamos pagar nossas contas e os funcionários. Desde que os perdemos, sofremos um prejuízo irreparável. Vivemos predominantemente dos aluguéis dos nossos imóveis. Entretanto, vivemos um momento de extrema dificuldade financeira. O salário dos nossos funcionários está atrasado três meses. Isso me causa uma dor imensa. Uma grande tristeza.
Porque a Prefeitura do Rio tirou essa concessão?
Teve todo aquele problema com o Dr. Dahas Zarur. Saiu algemado da Santa Casa. Eu chorei quando vi na TV. Uma injustiça. Disseram que ele roubou. Como? Jamais sequer fez uma viagem ao exterior. Tudo que aconteceu acabou matando ele. Entrou na Santa Casa por concurso e foi sendo convidado a ocupar cargos até que virou provedor pelo mérito. Deixou a Santa Casa e isso o levou a morte em pouco tempo. Eu o visitava e via um homem destruído diante de mim.
Depois de tudo, perdemos os cemitérios. Era um contrato público. Quem concedia era a prefeitura e após 97 anos o contrato não foi renovado. Mas não tenho nada contra ninguém. São pessoas do bem. A Santa Casa sofre no momento, mas daremos a volta por cima, como sempre.
O futuro
Meu mandato vai até o meio do ano de 2024. Estamos trabalhando com todas essas dificuldades e precisamos de muita ajuda para seguirmos de pé. Contamos com a renovação dos nossos quadros, com os irmãos e amigos da Santa Casa. A vida dessa instituição é beneficiar os mais necessitados e essa luta é sagrada e eterna. Assim como eu dizia nos tempos do Fluminense, aqui também é Vencer ou Vencer!
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