Presidente da ABSB e Abrasel se posicionam sobre PEC que reduz a semana de 44 para 36 horas de trabalho
Um dos principais temas debatidos nas redes sociais brasileiras nesta semana é a PEC (Proposta de Emenda à Constituição) que prevê o fim da escala de trabalho 6×1 — seis dias de trabalho para um de descanso. Apresentada pela deputada Erika Hilton (PSOL-SP) em maio, a proposta tem como objetivo melhorar a qualidade de vida para o trabalhador, segundo a sua criadora, já que pretende trazer alternativas ao modelo de trabalho atual, reduzindo a jornada para 36 horas semanais, com quatro dias de trabalho e três de folga. Para ser protocolada, a PEC precisa do aval de 1/3 dos parlamentares. Até o momento, 79 deputados assinaram o documento, que precisa ter 171 assinaturas para ser protocolado.
A proposta é do Movimento VAT (Vida Além do Trabalho), liderado pelo vereador eleito pelo Rio de Janeiro Rick Azevedo (PSOL), e o movimento já conseguiu quase 2,5 milhões de assinaturas em defesa da proposta. No entanto, a PEC tem dividido opiniões. Mais comum na indústria e no comércio, a escala 6X1 adotada atualmente confere que os profissionais com carteira assinada trabalhem seis dias da semana consecutivos e tenham um dia de descanso semanal, somando as 44 horas de trabalho semanais máximas definidas pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).
A possível mudança tem preocupado os setores que funcionam todos os dias da semana, como o setor de bares e restaurantes, e comércio em geral. Segundo a Abrasel, Associação Brasileira de Bares e Restaurantes, a PEC traz potenciais impactos negativos para consumidores, sociedade e empreendedores do setor de alimentação fora do lar. “É uma proposta estapafúrdia e que não reflete a realidade. As regulamentações estabelecidas pela Constituição e expressas na CLT são modernas e já trazem as ferramentas para garantir condições de trabalho dignas e justas aos colaboradores. A legislação atual permite que os trabalhadores escolham regimes de jornada adequados ao seu perfil, sem a necessidade de uma alteração constitucional que impacte a operação dos estabelecimentos em todo o Brasil, além de prejudicar os consumidores”, afirma Paulo Solmucci, o presidente da entidade.
Para ele, existe uma demanda da própria sociedade de ter bares e restaurantes abertos sete dias da semana. “A mudança forçada na escala de trabalho teria impactos nesta oferta. Cerca de 95% do setor é de microempresas, que precisariam reduzir o horário de funcionamento diante da mudança, já que a folha de pagamentos é um dos maiores custos para manter o empreendimento aberto”, observa.
Com atuação em todo o território nacional, sendo que 5.570 municípios brasileiros possuem bares e restaurantes, o setor gera seis milhões de empregos diretos em todo o país, representando atualmente 2,7% do PIB nacional. Já segundo dados dos primeiros resultados da Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF) 2017-2018, divulgados pelo IBGE, do total das despesas das famílias brasileiras com alimentação, quase um terço (32,8%) é dedicado a refeições fora do domicílio. Ou seja, a mudança vai impactar diretamente no bolso do consumidor.
Essa é a maior preocupação da Abrasel: o aumento dos custos operacionais, o que, por sua vez, elevaria os preços finais para o cliente, afetando a experiência do consumidor e a competitividade do setor, num momento que, segundo pesquisa da Abrasel, cerca de um quinto do ramo trabalha com prejuízo. Estima-se que a medida poderia acarretar uma elevação de até 15% nos preços dos cardápios.
Setor de beleza se preocupa: “Empresários, clientes e profissionais poderão sentir os efeitos negativos dessa mudança sem a não existência de um bom estudo”, afirma presidente da ABSB
Outro setor que também está preocupado com os efeitos da PEC é o de beleza, produtos e serviços, que representa 4% do PIB e movimenta R$90 bilhões de dólares anuais. Segundo o presidente da Associação Brasileira de Salões de Beleza, José Augusto Nascimento dos Santos, são 325.242 mil salões de beleza que podem ser impactados pela nova medida. “Estamos enfrentando uma crise sem precedentes de falta de mão de obra em todos os setores no Brasil. Falar em redução da jornada de trabalho nesse cenário é um desafio: quem assumirá os turnos descobertos em ambientes que operam continuamente, como shoppings? Além disso, os subsídios oferecidos pelo governo federal, embora importantes, podem estar desestimulando algumas pessoas a retornarem ao trabalho formal”, opina ele, com exclusividade para a Tribuna da Imprensa.
Por isso, ele reforça ser fundamental promover um debate aberto sobre a real intenção e os possíveis impactos desta PEC. “Discussões abertas e transparentes devem ser promovidas por meio de audiências públicas para garantir que as necessidades de empresários e trabalhadores sejam consideradas. Da forma como está apresentada, sem um debate mais profundo, a PEC pode trazer desafios significativos para setores que já sofrem com a escassez de mão de obra”, adianta José.
No caso específico dos salões de beleza, o presidente da ABSB afirma que a implementação da PEC poderá gerar impactos negativos na reposição de funcionários CLT para garantir o cumprimento da carga horária, demandando mais contratações, o que está difícil para manter o ritmo de atendimento. “Contudo, para os profissionais autônomos da beleza, esse impacto tende a ser menor, pois eles geralmente já administram a própria agenda de forma flexível”, diz.
Para o presidente da entidade, com a nova regulamentação alguns estabelecimentos poderão reduzir a oferta de horário de funcionamento, diminuindo o faturamento e afetando o atendimento ao público. “No final, todos, empresários, clientes e profissionais poderão sentir os efeitos negativos dessa mudança sem a não existência de um bom estudo”, completa ele, acrescentando que, hoje, são 1,2 milhões profissionais da beleza com MEI, sendo que são estimados cerca de 1,2 milhões de informais. Já em relação à CLTS, são 800 mil colaboradores com carteira assinada.
Foto: Midjourney