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quarta-feira, 22 jan, 2025

Geopolítica

Israel e Palestina: as origens de um conflito secular

Vítor Monteiro
Agência Brasileira de Comunicação

*Por Vítor Monteiro

 

Em mais um novo episódio de violência e brutalidade, palestinos e israelenses entraram em conflito no Oriente Médio, com quase dez dias de intensos bombardeios e tiroteios que geraram um banho de sangue e que cujo número de vítimas pode chegar a 3.000 (três mil) mortos, sendo a maioria composta por civis. Desta vez, a marca da bestialidade humana começa com um massacre sem precedentes com 400 (quatrocentos) homens armados do Hamas invadindo Israel e matando jovens que estavam em uma festa. Para além disso, foram realizados sequestros, onde famílias judias eram capturadas dentro de suas próprias casas e torturadas em nome de um terror que só remonta aos tempos sombrios da Segunda Guerra Mundial. Crianças foram mortas na frente de seus pais, mulheres foram violentadas. Este cenário de medo e desespero narrado não chega nem perto da realidade dos fatos e das descrições dos sobreviventes.

Os israelenses foram profundamente marcados por causa desses acontecimentos e declararam guerra com força total no intuito de destruir o Hamas e seus membros. Cabe aqui ressaltar que Hamas é um Partido Político Radical, considerado Grupo Terrorista pelos países ocidentais, que existe na Palestina, na qual venceu as eleições contra o Fatah, considerado um partido mais moderado e favorável a um diálogo com Israel.

O Hamas venceu as eleições de 2022, após ganhar 76 das 132 cadeiras do Parlamento da Autoridade Palestina, muito embora o presidente e o primeiro-ministro ainda sejam do Fatah. Mas vamos explicar um pouco melhor essa confusão política por meio da história e de mapas.

No pós-Segunda Guerra Mundial, com a vitória dos Aliados sobre os Países do Eixo (Alemanha, Itália e Japão), o território onde encontram-se Israel e Palestina estava sob o Mandato Britânico, e a recém-criada ONU estabeleceu como pauta a criação de um estado judeu devido à pressão de grupos sionistas (grupos de judeus, que desde o final do século XIX, principalmente da comunidade europeia, defendiam a restauração de um Estado Judeu Independente, sendo um dos principais expoentes o húngaro Theodor Herzl) por causa dos horrores perpetrados pelos Nazistas nos Campos de Concentração, gerando a morte de mais de seis milhões de pessoas.

Em novembro de 1947, sob a presidência do Diplomata Brasileiro Oswaldo Aranha, a ONU decidiu dividir o território da Palestina, onde, de acordo com a resolução, 55% do território seria para a criação do Estado de Israel e 45% para a criação do Estado da Palestina (em Gaza e na Cisjordânia). Israel foi criado, oficialmente, em 14 de Maio de 1948. Seis horas antes do término do controle britânico, quando o futuro Primeiro-Ministro de Israel, David Bem Gurion, leu a declaração de independência. Mas, infelizmente, no dia seguinte, árabes e judeus começaram os conflitos, sendo a Primeira Guerra Árabe-Israelense, conhecida também como a Guerra de Independência.

Desde esse primeiro conflito, exércitos do Egito, Síria, Iraque, Jordânia, Líbano e Arábia Saudita estavam unidos para atacar; porém, tal como nos futuros conflitos, eles viriam a perder.

 

 

Vitor
Foto: Brasil Escola (Ministério da Educação)

 

Depois da primeira guerra, a relação entre Israel e os países árabes seguiu bastante tensa. Na década de 1950, o Egito era governado por Gamal Abdel Nasser e possuía um governo extremamente nacionalista. Em 1956, o governo egípcio anunciou a nacionalização do Canal de Suez (que liga o Mar Mediterrâneo ao Mar Vermelho), o que desagradou aos governos francês e britânico, que possuíam interesses econômicos no canal. Assim, uma aliança da França e do Reino Unido com Israel foi realizada, e os três países juntos organizaram um plano para atacar as forças egípcias. Isso ocorreu em 29 de outubro de 1956, quando a Península do Sinai foi atacada pelas tropas dos três países, iniciando a Guerra de Suez.

Passados onze anos da Guerra de Suez, a relação entre árabes e israelenses ainda era tensa. Nesse contexto, surgiram grupos de resistência palestina: a Organização para a Libertação da Palestina (OLP) e o Al Fatah. Essa última agia por meio de táticas de guerrilha e promovia ataques contra Israel a partir de suas bases instaladas na Síria.

A partir do dia 5 de junho de 1967, o exército de Israel deu início à Guerra dos Seis Dias ao organizar um ataque como resposta aos árabes. Foram conduzidos ataques aéreos e terrestres de maneira fulminante. No prazo de seis dias, os israelenses haviam conquistado uma série de territórios. No dia 10, foi assinado um armistício, e a guerra teve fim. Como consequência dessa guerra, Israel conquistou Jerusalém Oriental, a Cisjordânia, Península do Sinai e Colinas de Golã. Foram realizadas negociações posteriores para discutir a devolução dos territórios ocupados por Israel, mas a intransigência das nações árabes fez com que as negociações fossem um fracasso. Alguns desses territórios estão ocupados por Israel até hoje.

Por fim, o último conflito aconteceu sete anos depois, em 1973, e ficou conhecido como Guerra de Yom Kippur (Dia do Perdão). Essa guerra iniciou-se a partir de um ataque surpresa conduzido por egípcios e sírios contra Israel no dia 6 de outubro de 1973, no Sinai e em Golã. Esse ataque foi uma tentativa das duas nações de recuperar os territórios que haviam perdido durante a Guerra dos Seis Dias. A Guerra de Yom Kippur apresentou diferentes fases: na primeira, houve vantagem das forças árabes; na segunda fase, as forças israelenses impuseram-se. A guerra estendeu-se até o dia 22 de outubro, quando, por mediação dos EUA e da URSS, uma trégua foi assinada. O objetivo das duas nações árabes de recuperar seus territórios, no entanto, não foi alcançado.

Mas voltemos aos tempos atuais: o Fatah tem maioria na Cisjordânia, inclusive com maior apoio popular; porém o Hamas é mais forte na Faixa de Gaza. Tanto que os noticiários sempre narram invasão da Faixa de Gaza e mencionam vilas da região como Beit Lahia, Rafa, Jabalia; quase não citando a Cisjordânia (muito embora também tenham conflitos armados).

O Hamas, ou Movimento de Resistência Islâmica, surgiu no contexto da Primeira Intifada, ou Guerra de Pedras, em dezembro de 1987, no campo de refugiados de Jabaliyah, no norte de Faixa de Gaza, quando atiraram paus e pedras contra tropas israelenses.  Este grupo político, com ações terroristas, é decorrente e herdeiro direto de outro grupo igualmente radical, a Irmandade Muçulmana, criada em 1928, que rejeitava todo e qualquer traço de cultura ocidental, pregando os ensinamentos do Corão. Para quem já leu o Corão, a Torah e a Bíblia, posso dizer que os versos dos três livros sagrados são belos, mas na mão de um fundamentalista religioso, tornam-se instrumentos de opressão.

Quando o título deste artigo fala em conflito secular, é porque o autor não quis voltar mais ainda na história e abordar as Cruzadas, quando árabes e judeus viviam juntos, coabitavam a região, e o exército cristão ia até a região com a guerra para retomar Jerusalém. Mas cabe uma nota da origem de Judeus e Palestinos, além de mais uma observação: judeu (da tribo de Judá) e palestinos (miscigenação entre filisteus, árabes e cananeus) são povos. Israelense é quem nasce Israel. Segundo o Antigo Testamento (conjunto de textos presentes na Bíblia e na Torah), Abraão e sua esposa Sara não podiam ter filhos por causa da condição desta; então Sara sugere que Abraão tome a escrava Egípcia Agar para que com ela tivesse um filho, que se chamou Ismael. Porém anos mais tarde, Abraão e Sara tiveram um filho Isaac que, conforme a narrativa bíblica, seria o prometido por Deus para que gerasse a descendência. Diante disto, Agar e Ismael foram expulsos para o válido árabe de Becá. Ismael deu origem à nação árabe; enquanto Isaac deu origem à nação Judaica. Pelas origens tradicionais, a briga de hoje é composta de dois povos historicamente irmãos.

A atual escalada de guerra, assim declarada pelo Primeiro-Ministro Benjamim Netanyahu tem por objetivo uma potencial ocupação da Faixa de Gaza para caçar terroristas do Hamas, mas acredito que isso só vá piorar a crise humanitária, uma vez que, apesar dos esforços de Israel para alertar a população palestina dos bombardeiros e dos ataques terrestres, existe uma pressão e um julgo para impedir a formação de um corredor humanitário para que civis fujam para o Egito. O fim deste conflito ainda é incerto, não aparece no horizonte, mas uma das soluções seria a criação de um Estado Independente da Palestina sem a presença do Hamas, tal como sugerido pelo presidente dos Estados Unidos, Joe Biden.

 

*Doutor Vitor Monteiro é advogado especializado em direito tributário e constitucional, formado pela UFRJ, com pós-graduação em relações internacionais pelo Curso Clio Internacional e em Comércio Exterior pela Fundação Aduaneiras. Atualmente faz mestrado em política e gestão estratégica na UFF.

 

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