Os ‘jabutis’, que pegam carona em outros projetos de lei, podem fazer o consumidor brasileiro de energia a pagarem mais uma cota por ano.
Quem consome energia no Brasil pode pagar uma conta de luz a mais por ano, isso para poder custear os novos subsídios ao setor aprovados na Câmara que devem ser analisados neste mês pelo Senado. Esse valos a mais ocorre por conta dos chamados “jabutis”, ou seja, propostas que estão inseridas em outros projetos de lei. Neste caso, os jabutis estão incluídos na proposta que cria o marco regulatório das eólicas offshore (em alto-mar).
Para Paulo Pedrosa, presidente da associação que representa os consumidores de energia, a Abrace Energia, “foi justamente o acúmulo dessas distorções que são conhecidas como jabutis que fizeram do Brasil o país da energia barata e da conta de luz cara.”E, se hoje a entidade afirma que a conta de luz de cada consumidor do país é, em média, de R$ 168,15 por mês, caso os subsídios sejam mantidos no Senado, haverá um gasto extra para cada consumidor de R$ 221,96 por ano.
Com base nesses números, a Abrace fez um recorte por estados e por distribuidoras, em todo o país. O estudo mostra que o impacto deve ser maior no Pará, onde haverá um aumento de R$ 313,07 para cada consumidor por ano. Já no estado do Rio de Janeiro, os municípios atendidos pela distribuidora Enel, como Niterói e São Gonçalo, terão aumento de R$ 297,23 no mesmo período, enquanto os municípios atendidos pela Energisa, no Mato Grosso, terão aumento de R$ 283,32.
Vale destacar que o projeto de lei que cria o marco regulatório das eólicas offshore serviu de “carona” para várias outras propostas, aprovadas na Câmara praticamente sem debate. Isso significa, de acordo com a PSR Energy, uma estimativa de que o custo total dessas medidas será de R$ 25 bilhões por ano, com potencial para encarecer a conta em cerca de 11%. No período de 27 anos, o custo total ao consumidor será de R$ 658 bilhões, com valor presente de R$ 287 bilhões.
No entanto, o relator do projeto na Câmara, o deputado Zé Vitor (PL- MG), contestou as contas realizadas pelas entidades, afirmando que elas só estão preocupadas com os seus interesses. “Os números apresentados pela Abrace não encontram fundamentos, é puramente uma defesa de privilégios”, rebateu. O Ministério de Minas e Energia (MME) não se manifestou.
Fique por dentro dos ‘jabutis’
Por conta do PL das eólicas offshore, oito “jabutis” irão impactar diretamente a conta de luz. O principal deles altera uma medida estabelecida durante a privatização da Eletrobras, cuja proposta determinou a contratação obrigatória de 8 gigawatts (GW) de térmicas a gás nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste, estabelecendo, porém, um preço teto para a compra dessa energia. Na Câmara, houve a redução de 8 GW para 4 GW, mas o teto para o preço máximo deixou de existir.
O fato é que tal manobra tem como objetivo viabilizar não somente a geração por parte dessas usinas, mas também o financiamento dos gasodutos, já que nas regiões citadas não há oferta de gás para que as térmicas possam operar. “É uma ineficiência completa. O consumidor terá de pagar pela construção dos gasodutos para levar gás a uma térmica onde não existe esse matéria-prima. Como são regiões já exportadoras de energia, a energia elétrica terá de viajar de volta, por novas linhas de transmissão, também pagas pelos consumidores, para chegar ao mercado”, afirmou Pedrosa.
Já os outros 4 GW de energia “compulsória”, que terá de ser contratada pelo setor, foi direcionada para as pequenas centrais hidrelétricas (PCHs), atendendo a outros grupos de interesse. Quanto maior a quantidade de energia “compulsória”, menor a flexibilidade do Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) para despachar fontes mais baratas para os consumidores.
Embora o projeto trate do marco regulatório para energia eólica, de energia limpa, um desses jabutis prorroga por mais dez anos o tempo de operações de usinas termelétricas a carvão nos estados do Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná. Antes, essas térmicas deixariam de operar em 2040. Agora, houve a ampliação desse período, para 2050, e inclusão de novas usinas.
E, por fim, há ainda jabutis prolongando o prazo para que projetos de energia renováveis entrem em operação com subsídios (mesmo já tendo caído o preço dessa energia), postergação para projetos de minigeração distribuída (MMGD), extensão de contratos do Programa de Incentivo às Fontes Alternativas (Proinfra), além da contratação compulsória de energia de hidrogênio e de plantas eólicas no sul do país.