“A maioria dos órgãos carece de autoridade e meios de implementação para fazer cumprir as suas decisões,” disse o presidente brasileiro
O Pacto para o Futuro, documento que será assinado pelos líderes mundiais que vão participar da Assembleia da Organização das Nações Unidas (ONU), em Nova Iorque (EUA), não conta com a “ambição e ousadia” para que a organização cumpra o seu papel, disse o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), em seu primeiro discurso durante a Cúpula do Futuro, realizada neste domingo (22). Para Lula, a atual crise da governança global exige transformações estruturais, especialmente no que diz respeito aos recentes conflitos armados.
“A pandemia, os conflitos na Europa e no Oriente Médio, a corrida armamentista e a mudança do clima escancaram as limitações das instâncias multilaterais. A maioria dos órgãos carece de autoridade e meios de implementação para fazer cumprir as suas decisões. A Assembleia Geral perdeu sua vitalidade e o conselho econômico e social foi esvaziado”, afirmou o presidente brasileiro em sua fala.
Na edição passada, as resoluções apresentadas pelo Brasil foram reprovadas por países membros. Com destaque a Resolução no Conselho de Segurança sobre o conflito entre Israel e o Hamas. Na ocasião, o voto contrário foi dos Estados Unidos – membro permanente -, apesar da longa negociação da diplomacia brasileira. Outras resoluções também fracassaram por votos contrários dos americanos, e da Rússia, outro membro permanente.
Segundo as regras do Conselho de Segurança da ONU, para a aprovação de uma Resolução é necessário o apoio de nove dos 15 membros permanentes, sendo que nenhum deles pode vetar o texto.
Pacto do Futuro
O Pacto do Futuro é um evento prévio à Assembleia Geral, que reúne líderes mundiais para discutir o enfrentamento de crises de segurança emergentes, otimizar o cumprimento dos 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) e tratar sobre temas ligados às tecnologias digitais.
Para Lula, o encontro é positivo por tratar “de forma inédita” questões, como: dívida de países em desenvolvimento e tributação internacional; criação de uma instância de diálogo entre chefes de estado e de governo e lideranças de instituições financeiras internacionais. De acordo com presidente, a iniciativa reposiciona a ONU no centro do debate econômico mundial.
Sobre o ambiente digital, Lula destacou a necessidade de um avanço para a implementação de uma governança digital inclusiva que “reduza as assimetrias de uma economia baseada em dados e mitigue o impacto de novas tecnologias como a inteligência artificial”. Lula disse ainda que “todos esses avanços serão louváveis e significativos, mas, ainda assim, nos falta ambição e ousadia.”
Sobre o Conselho de Segurança da ONU, o presidente petista disse que, ao aplicar duplos padrões ou se omitir diante de atrocidades, a organização se encolhe. Ele também criticou as instituições de Bretom Woods, como o Fundo Monetário Internacional (FMI) e o Banco Mundial, que, segundo ele, desconsideram as prioridades e necessidades do mundo em desenvolvimento. “O Sul Global não está representado de forma condizente com seu atual peso político, econômico e demográfico”, asseverou.
Quanto à agenda multilateral de reforma do sistema ONU, Lula disse que houve pouco avanço nos últimos 20 anos, mas citou como medidas positivas a criação, em 2005, da Comissão para Consolidação da Paz, e do Conselho dos Direitos Humanos, em 2006. Sobre desenvolvimento sustentável, o presidente destacou que a sua concretização caminha para se tornar o “nosso maior fracasso coletivo”.
“No ritmo atual de implementação, apenas 17% das metas da agenda 2030 serão atingidas dentro do prazo. Na presidência do G20, O Brasil lançará uma aliança global contra fome e a pobreza, para acelerar a superação desses flagelos”, pontuou o Luiz Inácio, acrescentando que se lentidão para reduzir os níveis de emissão de gases de efeito estufa e de financiamento climático se mantiverem, o planeta continuará inseguro.
“Em parceria com o secretário-geral [da ONU, António Guterres], como preparação para a COP30, vamos trabalhar para um balanço ético global, reunindo diversos setores da sociedade civil para pensar a ação climática sob o prisma de justiça, da equidade e da solidariedade”, adiantou.
Direitos humanos
O presidente ressaltou ainda que a agenda dos direitos humanos e da promoção da paz devem ser um compromisso para todos, sem possibilidade de retrocessos.
“Não podemos recuar na promoção da igualdade de gênero, nem na luta contra o racismo e todas as formas de discriminação. Tampouco podemos voltar a conviver com ameaças nucleares. É inaceitável regredir a um mundo dividido em fronteiras ideológicas ou zonas de influência. Naturalizar a fome de 733 milhões de pessoas seria vergonhoso. Voltar atrás em nossos compromissos é colocar em xeque tudo o que construímos tão arduamente”, afirmou, acrescentando: “Precisamos de coragem e vontade política para mudar, criando hoje o amanhã que queremos. O melhor legado que podemos deixar às gerações futuras é uma governança capaz de responder de forma efetiva aos desafios que persistem e aos que surgirão”, conforme reproduziu a Agência Brasil.
Cúpula do Futuro e Assembleia Geral
A Cúpula para o Futuro, que ocorre de forma paralela à Assembleia Geral da ONU, resultou em um documento que foi aprovado pelos estados-membros neste domingo. A declaração tem como objetivo reforçar a cooperação global para solucionar os desafios atuais.
Nesta terça-feira (24), seguindo a tradição, caberá a Lula fazer o tradicional discurso de abertura na Assembleia Geral das Nações Unidas. Desde a 10ª sessão da cúpula, o presidente brasileiro é o primeiro a discursar.
Patricia Lima